Viagem a Paris

August 12, 2023    viagem

Após uma das corriqueiras ligações semanais em que eu e meus pais passávamos a limpo a semana, atualizando uns aos outros sobre o que aconteceu de cada lado do Atlântico, ficou decidido que minha mãe não viajaria mais em Dezembro. Não, pois ela viria a Paris em Julho, e portanto tinha pouco mais de 6 semanas para se preparar.

Não só ela conseguiu se preparar, como também houve tempo de convencer (sem muito esforço) meu primo Gustavo, que respondeu com um empolgado “sim”, quando perguntado sobre o desejo de visitar o velho mundo. De fato, não era difícil imaginar a animação de um menino de 14 anos frente à possibilidade de fazer essa viagem, coisa de filme – ou videogame.

Passaportes prontos, passagens compradas, autorização para viagem de menores autenticada em cartório. Soma-se ao check-list o usual que vai numa mala para 12 dias de viagem, além é claro dos meus pedidos especiais: feijão, erva-mate e pé de moleque. Minha mãe preparou tudo com muito carinho.

Do meu lado, a animação da iminente oportunidade de férias europeias em família alimentou a pujança de algumas dezenas de horas dedicadas para planejamento, o que resultou em um itinerário dedicado a experienciar o máximo possível que a França poderia nos oferecer em 10 dias.


No aeroporto, fiz questão de recebê-los com itens marcantes do café da manhã francês: pain au chocolat e croissant. Chegando em casa, mais um café francês os esperava, agora mais no formato de um brunch, com cogumelos, queijos, baguette e salame. O resto do dia seria conhecer Paris e visitar o seu maior marco, a torre Eiffel.

Os próximos dias não ficariam pra trás. No domingo, saímos cedinho para a visita a Versalhes, agendada para às 9h da manhã. Além do papel de fotógrafo, atuei também como ajudante para segurar o queixo da minha mãe que insistia em ir ao chão a cada sala do palácio, cada pintura, cada vista do exuberante jardim que nos rendeu alguns quilômetros de caminhada.

Na segunda, também às 9h, tínhamos na agenda a visita ao maior museu do mundo. Entramos no Louvre pela porta de dentro, que tinha menos fila do que a pirâmide. Começamos a visita pelo Egito Antigo, e o Gustavo, que é enxadrista de competição, descobriu que há 5 mil anos atrás já se jogava jogos de tabuleiro. Depois de tirar selfie com uma múmia, seguimos até a Babilônia, onde discutimos sobre os absurdos do código de Hamurabi. Já na seção sul do museu, vimos quadros maiores que a planta de muito apartamento por aí, dezenas de estátuas de mármore que pareciam estar vivas, e claro, depois de uma longa fila, vimos um quadrinho de uns dois palmos de altura com o qual tiramos selfie. Foi um prazer conhecê-la, Monalisa, até a próxima!

Falando em próxima, no dia seguinte começou a segunda parte da viagem, já que ao meio dia da terça-feira estávamos desembarcando em Lyon, há 460 quilômetros de Paris, para pegar um carro e dirigir por quase 3 horas até o coração dos Alpes franceses. Chegando em Chamonix, parei o carro com o pisca alerta ligado e fui procurar a garagem, acompanhado do Gustavo, que estava se revelando um excelente parceiro de navegação. Nesse dia caminhamos pelo centrinho, comemos Kebab (comida árabe), e chegamos em um bar que servia cerveja, aperol¹ e milkshake – agradando todos os envolvidos.

Antes da 6h da manhã foi o horário de acordar no dia seguinte, pois o passeio de teleférico para Aiguille du Midi, ponto mais alto da região para observar o grande Mont Blanc e seus 4818 metros de altura, estava agendado para 7h. Qual não foi nossa surpresa, porém, ao escutar uma chuva torrencial lá fora. Uma visita ao site do passeio revelou ainda que os ventos estavam fortes lá no alto da montanha, mas que havia chances de podermos subir a partir das 9h.

Inquieto com a ideia de desperdiçar 2 horas em casa, e animado ao ver a chuva passar, descobri um trenzinho que cruzava os vilarejos da região, e propus fazermos um mini-tour. Navegar por apenas 2 estações foi suficiente para desembarcarmos ao lado de um lindo lago, donde podíamos ver as montanhas lá de cima refletindo na água calma, oferecendo assim algumas das melhores fotos da viagem.

Retornando ao centro, descobrimos que o passeio realmente estava liberado a partir das 9h, mas que poderíamos ascender apenas até o primeiro estágio, pois os ventos lá em cima ultrapassavam 100 km/h. Bom, para quem nunca havia viajado de teleférico, o passeio mais do que valeu a pena, pois fomos transportados 1200 metros acima da cidade, de onde podíamos ver todo o vale de Chamonix e arredores. Lá em cima, pegamos uma trilha montanha acima, onde após deixarmos a minha mãe descançando, eu e o Gustavo alcançamos, para alegria dele, alguns bancos de neve remanescentes do inverno. Essa trilha, infelizmente, tinha trechos com pedregulhos, os quais levaram minha mãe a torcer o pé, o que não a impediu de continuar andando mas reduziu pela metade o seu ritmo de caminhada pelos próximos 4 dias.

Tudo isso aconteceu na quarta até o meio dia, e após descermos ao vilarejo, pegamos um trem montanha acima com o objetivo de entrarmos numa caverna de gelo. Após sair do trem, pegar outro teleférico, e caminhar por 30 minutos, alcançamos o corpo de um glacier, praticamente um rio de gelo, no qual equipes de turismo abriram uma caverna geladíssima para visitação. O final desse dia foi guardar as malas, minha mãe aplicou gelo no pé, e dormimos cedo.

Sabendo das 5 horas de viagem que teríamos até os campos de lavanda em Valensole, acordamos antes das 6h e às 7h estávamos deixando o vale de Chamonix. A cada vale montanhoso que cruzávamos, víamos pelas colinas casas com feições distintas, feitas de pedra, madeira, madeira-de-outra-cor, e assim por diante. Aos poucos deixamos as montanhas e começamos a enxergar no horizonte plano um tom lilás. Paramos o carro junto a dezenas de outros turistas, e adentramos uma roça de flores! Ali tiramos fotos alinhadas com a plantação de lavanda enquanto as abelhas zuniam no nosso ouvido. Tocamos então até Valensole para almoçar, e seguimos viagem.

O destino era Grasse, a capital mundial do perfume. Até faz sentido, estando pertinho das lavandas. Mas o que não esperávamos era o nó no estômago das infinitas curvas na estrada que conectava as cidadezinhas agrárias (e por vezes turísticas), ao litoral da França. Depois de torcer muito o pescoço e fazer curvas após curvas de 180 graus, chegamos na tal capital cheirosa.

O que ninguém me avisou, porém, é como as ruas de algumas cidades históricas podem ser estreitas, preparadas para charretes, e não para carros utilitários. Mais do que isso, no dia do aluguel do carro, os SUVs estavam em falta, então fomos agraciados com um Volvo tamanho família, que era super confortável de viajar, mas não tanto assim de se esgueirar por ruelas de cidades medievais. Enfim, após a ajuda da minha mãe e do Gustavo como terceiros olhos, consegui estacionar e, após 5 andares de escadas que precisavam muito de uma reforma, nos instalamos no apartamento, que era bonito mas ao mesmo tempo parecia ter sido projetado na Grécia antiga.

Grasse foi só para dormir (e comprar perfume), pois o objetivo, que seguimos no dia seguinte, era irmos até Nice, onde conheceríamos finalmente o litoral francês e, por conseguinte, o mar mediterrâneo. Se por um lado a viagem até Nice foi curta, não mais do que 1 hora, por outro a dinâmica da cidade e o tamanho do carro nos fizeram gastar mais 1 hora até encontrarmos onde estacionar. E o fizemos com sorte, pois o carro que saiu da nossa frente enquanto eu tentava pedir dicas de estacionamento em franco-inglês para o AirBnb foi o único a liberar uma vaga naquele dia.

Bem, Nice foi sentir muito calor, ver praia com pedrinhas ao invés de areia, água gelada e sem ondas, e um mar azul anil que se tornava bem fundo em poucos metros. Deu tempo ainda de um sorvetinho, e de visitar uma catedral russa com arquitetura de conto de fadas. Dormimos cedo, pois o dia seguinte dia esperava outra viagem de 5 horas, dessa vez para retornar o carro em Lyon e pegar o trem de volta para Paris.

Já era sábado novamente, a primeira semana na França dos meus convidados que aceitaram essa viagem maluca. Cuidadosos em não arriscar perder o horário do trem, deixamos Nice às 6h da manhã. Devolvemos o carro em Lyon ao meio dia, almoçamos alguma comida coreana que eu não vou lembrar o nome, e pegamos o trem de volta às 17h. Chegando em Paris fomos direto pra casa, só querendo jantar e dormir, pois queríamos ter energia para os últimos 2 dias parisienses.

No domingo cedo fomos ver a Basílica do Sagrado Coração, onde pudemos assistir à missa e subir na torre da igreja para ver uma vista panorâmica de Paris. Depois, eu e o Gustavo pagamos todos os pecados ao esperar a minha mãe passar por todas as lojinhas de souvenires da região, caçando itens para trazer de volta para meu pai e aos pais do Gustavo. Para terminar o dia, fomos conhecer a Catedral de Notre Dame e depois tomamos um gelato no Jardim de Luxemburgo, que está entre os parques mais bonitos de Paris.

Felizes em frente à basílica.

Segunda, o último dia antes do retorno, foi dia de levar minha mãe às compras no shopping, e de comprarmos itens pro piquenique. Sim, pra fechar a viagem, planejamos um piquenique o Jardin des Tuileries, que fica próximo ao Louvre, o qual ainda não havíamos visitado. Para nossa surpresa, no entanto, percebemos que nesse parque não há espaço para piquenique, pois o gramado é somente para decoração.

Com isso, tivemos que fazer uma longa caminhada, ao longo do rio Sena, passando pela Ponte Alexandre, para encontrarmos um lugarzinho no gramado em frente à Torre Eiffel. Tem dias que é puxado! Enquanto abríamos a manta no chão e espalhávamos as comidas, o Gustavo descobriu que o melhor jeito de fazer uma geleia de framboesa é guardar as framboesas no fundo da mochila. Nesse dia, nesse local, sob um céu limpo e um sol agradável, tivemos uma das refeições mais gostosas e satisfatórias de toda a viagem – e provavelmente da vida.


Notas: ¹ Aperol Spritz é um drink popular francês que lembra um vinho rosé e é misturado com água com gás.



comments powered by Disqus